Incrível trabalho de ilustração de Simon Prades e o discurso de Haruki Murakami na cerimónia de entrega do Prémio Internacional da Catalunha:
"Na língua japonesa temos uma palavra – “mujô” – que designa o facto de nada ser permanente, não existe nada que dure para sempre. Todas as coisas que existem no mundo se extinguem, tudo se transforma constantemente. Não há um equilíbrio eterno, nada é imutável porque não se pode confiar nelas para sempre.
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Poderíamos dizer que esta ideia do "tudo tem um fim" implica uma certa resignação com o mundo, isto é, nada do que o homem faça poderá opor-se ao curso da natureza. Contudo, os japoneses conseguiram encontrar uma forma bela de encarar esta resignação.
Se olharem com atenção para a natureza, por exemplo, na Primavera admiram as ‘sakura’, no verão os pirilampos, e no Outono as folhas amarelas dos bosques. Dia a dia, observam tudo com paixão, a cada momento, como uma rotina, quase como se fosse um axioma. Quando chega o tempo respectivo, os locais mais famosos para se verem as flores de ‘sakura’, ou os pirilampos, ou as folhas outonais, enchem-se de gente, e torna-se quase impossível de fazer reserva num hotel.
Porque a beleza das ‘sakura’, dos pirilampos, e das folhas do Outono, desaparece ao fim de um tempo. Os japoneses percorrem inúmeros quilómetros para poderem ver o esplendor da efemeridade destes fenómenos. Mas não se limitam apenas a observar essa beleza, pois também se aliviam ao descobrir como se espalham as flores das ‘sakura’, a luz ténue dos pirilampos, ou como se apagam as cores vivas das árvores. Na verdade, encontram a paz quando a beleza já atingiu o clímax, e começa a desaparecer...
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Tal como disse no princípio, vivemos num mundo de mudança e transição, marcado pelo conceito de “mujô”, que nos diz que qualquer estilo de vida muda e acaba por desaparecer. Que o Homem é impotente perante a força enorme da natureza. A consciência desta transitoriedade é uma das ideias básicas da cultura japonesa. Ao mesmo tempo, e apesar de respeitarmos as coisas que desapareceram e estarmos conscientes de que vivemos num mundo frágil em que tudo pode desaparecer a qualquer instante, nós japoneses também temos uma mentalidade positiva que nos impulsiona a viver com alegria.
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Fico muito contente por partilhar uma mesma história com vocês. O trabalho dos escritores é sonhar. Mas ainda temos um trabalho mais importante: partilhar os nossos sonhos com os outros. É impossível ser-se escritor sem ter esta sensação de querer partilhar o que se escreve.
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Não devemos ter medo de sonhar. Não podemos deixar-nos engatar pelas causas dos desastres, que se apresentam com o nome de “eficácia” e “conveniência”. Devemos ser “sonhadores pouco realistas”, avançando em passo firme. Os humanos morrem e desaparecem. Mas a humanidade perdura. É algo que se prolonga indefinidamente. Acima de tudo, temos de crer na força da humanidade."
{discurso via Murakami PT, via facebook da Ana}
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Amazing illustration work of Simon Prades and Haruki Murakami's speech at the ceremony of Catalonia International Prize:
"In the Japanese language we have a word - "mujô" - which means that nothing is permanent, there is nothing that lasts forever. All things that exist in the world vanished, everything changes constantly. There's no eternal balance, nothing is immutable because you can not trust them forever.
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We could say that this idea of "everything has an end" implies a certain resignation to the world, this means that there's nothing that man can do to oppose the course of nature. However, the Japanese had found a beautiful way to look at this resignation.
If you look closely at nature, for example, in the spring they admire the 'sakura', the fireflies in the summer, and in the autumn the yellow leaves from the woods. Day by day they watch everything with passion, every moment as a routine, almost as an axiom. When the time comes, the most famous places to see the flowers of 'sakura', or fireflies, or autumn leaves, get fill with people, and it becomes almost impossible to book a hotel.
Because the beauty of the 'sakura', fireflies, and the leaves of autumn, disappears after a while. The Japanese can travel many miles to see the splendor of the transience of these phenomena. But they don't limit themselves to just see this beauty, they also feel relief when they discover how the flowers 'sakura' and the dim light of the fireflies spread, or how the vivid colors of the trees go off . Indeed, they find peace when beauty has reached the climax, and starts to disappear...
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As I said in the beginning, we live in a world of change and transition, marked by the concept of "mujô", which tells us that any lifestyle changes and eventually disappear. That man is powerless when facing the huge force of nature. Awareness of this transience is one of the basic ideas of Japanese culture. At the same time, and although we respect the things that have disappeared and we're aware that we live in a fragile world where everything can disappear at any moment, we Japanese also have a positive mindset that drives us to live joyfully.
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I am very pleased to share with you the same story. The work of writers is to dream. But we still have a most important job: to share our dreams with others. It is impossible to be a writer without having that feeling of wanting to share what you write.
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We should not be afraid to dream. We should not engage in the causes of disasters, which come with the name of "efficiency" and "convenience." We must be "unrealistic dreamer", advancing at a steady pace. Humans die and disappear. But humanity endures. It's something that continues indefinitely. Above all, one must believe in the power of humanity.
{Speech via Murakami PT, via Ana facebook }
As ilustrações são perfeitas para o discurso do Murakami. A filosofia de vida dos japoneses é para os ocidentais muito difícil de atingir. Eu gostava muito de conseguir fazer essa aprendizagem.
ReplyDeletePois é, mas essa aprendizagem é algo intrínseco. Uma bagagem tão tão forte, com tantos anos. Acredito mesmo que nós somos muito mais do que aquilo que somos no nosso quotidiano ou nesta vida, somos a soma dos nossos antepassados e de todas as pequenas coisinhas enraízadas à nossa volta. Há coisas/ sentimentos de que é impossível escapar. E acredito que é possível estudares e aprenderes a ser como eles, mas como tu dizes, atingir é difícil, sobretudo porque todas as culturas têm coisas maravilhosas e outras que para quem está de fora vão do incompreensível ao abominável.
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