the hands show the way of the heart

# Dia 59

| On
July 26, 2010


Sábado acordei cedo. Às 8h30 estava fora de casa e pronta para visitar a minha primeira comunidade. O Jardim das Gaivotas, em São Paulo.

Apanhámos o Ronaldo na Alemoa e o Tiago na Vila dos Criadores (duas favelas daqui de Santos). Eles iam ajudar-nos com a missão de organizar o próximo encontro de comunidades.

Fico assombrada com a quantidade de favelas que estão aqui à minha volta. Tão perto.
No caminho perguntei à Val como é que isto acontecia, porque é que não é possível controlar esta situação? Eles explicaram-me que quando o governo oferece casas, muitas pessoas vendem essas casas e regressam para a favela. O problema reside sobretudo na falta de orientação. Tira-se a pessoa da favela, mas não se tira a favela da pessoa. Se pensar bem, somos todos assim em relação a várias coisas, temos todos as nossas "favelas" pessoais, coisas de que não queremos fazer parte mas que não conseguimos viver sem, porque, simplesmente, não estamos educados nem programados para isso. É preciso fazer essa reprogramação e isso é extremamente difícil.

Eu cresci habituada a um modo de vida. Sempre tive uma casa, sempre vi os meus pais pagarem por essa casa. Para mim, sempre foi natural imaginar vir ter essas responsabilidades no meu futuro, e ter, consequentemente, estes confortos e estas definições de conforto que tenho hoje. Não seria natural para mim viver numa comunidade em que construí anárquicamente a minha casa num espaço protegido pelo governo, por exemplo, como fizeram na Alemoa.

Quando vocês pensam em Jardim das Gaivotas o que é que vos ocorre? Na minha imaginação vejo um jardim lindo. O rio lá ao fundo. As gaivotas esvoaçam. Que bom! O sol reflectido na água. O riso das crianças e, bem... a realidade não é esta. No caminho para lá passamos por uma avenida enorme, com muita gente, muitas lojas, muito ruído, casas semi-terminadas... semi-começadas, não dá para entender. Tenho dificuldade em descrever-vos, porque, na maior parte da vezes, tento manter um olhar apreciativo e ver para além de tudo o que está imediatamente à minha frente.

O Sr. Litão e a Cláudia vêm buscar-nos. Conhecemos a Dona Madalena. A Nádia. Levam-nos a comer uma feijoada deliciosa e, a seguir a um passeio, começa o debate.

Olho à minha volta e é difícil ver belezas. Mas, ao mesmo tempo, sinto que estou cheia de ideias pré-concebidas sobre o que é bonito e sobre o que é abundante e que, enquanto estou ali, tenho que me distanciar disso, tenho que procurar os pontos de luz.

O Tiago diz: "têm aqui uma bela comunidade". Como é que eu não fui capaz de ver isso sem reflectir? Sem racionalizar?

Precisei de me reprogramar. Mas acho que consegui. Fui capaz de ver o canal maravilhoso que eles têm para os passeios de barco, o esforço que todos fizeram, juntos, para colocar cimento na ladeira, o pequeno campo de futebol que o Adriano quer ampliar, uma árvore florida, a roupa estendida ao sol, as gaiolas penduradas nos murais e a simpatia e generosidade das pessoas que podem ter muito pouco para oferecer, mas que nos receberam com braços e sorrisos abertos e vontade de fazer qualquer coisa grande, como abrir a porta da sua casa e construir qualquer coisa com outras pessoas.
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